domingo, 7 de junho de 2015

Paulo Cabral: ''Pura falácia" Sociólogo e professor 29 de Maio de 2015 | 00h00

Na madrugada de 27 de maio, a Câmara dos Deputados votou pontos  da Reforma Política. O placar final, com a derrota pessoal do presidente da casa, Eduardo Cunha, teria sido contaminado pelo espírito de corpo dos parlamentares, indignados com a truculência exibida por ele, ao dissolver a Comissão Especial que, durante três meses se debruçou sobre o tema e cujo relator, deputado Marcelo Castro , recusou-se a contemplar o “distritão” no relatório final, proposta também rechaçada pelo plenário.
Outro ponto importante defendido pelo presidente da Câmara visava incluir na Constituição Federal a autorização do financiamento empresarial de campanha, isto porque o STF discute a constitucionalidade dessas “contribuições”. O processo permanece engavetado pelo ministro Gilmar Mendes  e poderá concluir desfavoravelmente aos que vem se beneficiando desse esquema, daí a proposta.
A votação dessa matéria foi emblemática  nessa  conjuntura  marcada pelas investigações da Operação Lava-Jato, a esmiuçar  as operações da Petrobras, comprovando o nexo causal entre “doação de campanha” e corrupção. Antes, especulava-se a hipótese desse nexo, agora ele foi explicitado, é real, efetivo, insofismável; o conjunto probatório recolhido com depoimentos, delações premiadas e documentos é indiscutível. Empresas que financiam candidatos a cargos eletivos,  para o Executivo ou Legislativo, não o fazem por questões ideológicas, até porque o capital não tem cor partidária, mas sim pretendendo vantagens. É como se apostassem em uma bolsa, no mercado futuro, exercendo seu poder econômico. 
Muitos se chocaram com as evidências escancaradas à exaustão,  embora não seja novidade alguma. Muitos insistem em colocar viseiras, só enxergando o inegável  escândalo do Petrolão. Mas quando se examinam as empreiteiras com dirigentes  detidos por corrupção ativa, verifica-se que elas são exatamente as mesmas presentes nos grandes projetos das grandes obras, seja de outros setores da administração federal, seja de governos estaduais ou municipais. Resumo da ópera, o Petrolão poderia ser apenas a ponta do iceberg.
A pedagogia da Lava-Jato nos ensinou, então, que financiamento empresarial de campanha desagua, obrigatoriamente, em corrupção, o modus operandi  mediador das relações entre os poderes econômico e político. Assim, aprendemos que ele é promíscuo, não deve existir. Claro que a corrupção não será eliminada só com essa restrição, como num passe de mágica, mas se estancará uma de suas poderosas matrizes.
A despeito da derrota da madrugada, quando Tereza Cristina esteve ausente, Marun e Geraldo Rezende votaram a favor e e os demais deputados contra o financiamento de campanhas por  empresas; à noite a matéria foi recolocada em pauta e aí, dados os mistérios que só a política consegue abrigar, o resultado se inverteu, sendo mantidas as “doações” de empresas para os partidos. Dizer que o custo do financiamento público seria muito elevado e bancado pelos cidadãos é falácia, pois o custo da corrupção decorrente do financiamento por empresas é infinitamente superior e isto está comprovado.
Dizer que agora os candidatos estarão impedidos de receber diretamente recursos de empresas, que elas deverão fazer a “doação” só ao partido, longe de revestir com alguma legitimidade a malfadada prática, torna-a ainda mais perversa; primeiro porque os partidos políticos são instituições de baixíssima credibilidade, em geral, instrumentalizados por suas lideranças para realizarem seus projetos pessoais de poder; segundo porque neste novo formato não haverá mecanismos transparentes para se saber exatamente que parlamentares estarão a serviço de quais grupos financiadores. Assim, mudou-se para pior,  um retrocesso. 
Na segunda votação,   Marun e Geraldo Resende apoiaram o financiamento de empresas, assim como Tereza Cristina, que compareceu e Mandetta e Eliseu Dionísio que mudaram o voto.    Dagoberto, Vander e Zeca mantiveram-se contra. Se tanto nos indignamos com a corrupção, por que permitir estratégias que a alimentam? Votar pelo financiamento de empresas representa votar pela corrupção. 
Com o fim da reeleição para cargos majoritários, a influência do poder das empresas poderá se tornar ainda maior nas decisões eleitorais, deixando claro que a “reforma” política votada não passou de triste arremedo. Se quisermos mudar de fato, só com a convocação de uma Constituinte exclusiva para propor uma nova ordem política.

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